quarta-feira, 10 de junho de 2015

ANJOS DA GUARDA - PARTE 2

   Na última matéria falamos sobre o trabalho do bombeiro de aeroporto, uma atividade diferente do bombeiro urbano por ser específica do sítio aeroportuário, tendo a matéria sido feita em visita ao Aeroporto da Pampulha.

   Todavia, no Aeroporto da Pampulha também está presente a unidade aérea do bombeiro urbano, o profissional preparado para socorro e salvamento através de aeronave, além do combate a incêndio em matas e florestas. Obviamente não poderíamos deixar de fazer uma matéria sobre esses também "Anjos da Guarda". Indo além, através da intermediação de Jean Augusto Castro Costa, entrevistamos um deles para saber mais da vida de homens que optaram por socorrer e salvar vidas.
   
Mas, antes da entrevista, uma breve apresentação do Batalhão de Operações Aéreas do Estado de Minas Gerais.

   O BOA tem uma frota de quatro aeronaves, todas batizadas com o sugestivo nome de "Arcanjo", palavra de origem grega que, segundo a 13ª edição do dicionário MEC, significa "anjo de ordem superior; o primeiro dentre os anjos".

   O "Arcanjo 01" é um Cessna 210, a primeira aeronave do Batalhão, cuja principal missão é o monitoramento de incêndios em matas e florestas...

...os "Arcanjos 02 e 03" são helicópteros Esquilo, cuja denominação de fábrica é AS 350 B2, montados na Helibrás em Itajubá/MG. Estas aeronavaves são equipados com guincho para içamento e dispositivo sob a fuselagem que permite operar o "bambi bucket", equipamento para combate a incêndio com capacidade para 540 litros de água...


...e um EC 145, o "Arcanjo 4", aeronave esta que possui uma pequena UTI à bordo, podendo atender duas vítimas simultaneamente, além de permitir procedimentos médicos, devido ao maior tamanho de sua cabine.

   Pois bem, no dia 31 de maio, uma agradável manhã de domingo, fomos cordial e fraternalmente recebidos no hangar do Batalhão de Operações Aéreas, pelo seu Comandante Major Eduardo Cota Ramos, e toda a Equipe de plantão, para entrevistar Francisco Geraldo de Oliveira, Bombeiro já em processo de transferência para a Reserva.




AVHoje - o que o levou a procurar a carreira de bombeiro?
Francisco: meu pai era bombeiro. Cresci vendo o seu trabalho, sendo influenciado pelos seus exemplos e desejando ser como ele. Quando entrei para a Corporação o salário era menor do que o de garçom, a minha profissão anterior. Mas isso foi secundário para mim, pois estava realizando o meu ideal. Ingressei no ano de 1987, mas sempre pensando na aviação militar.   No ano de 2006 eu fiz o curso de tripulante operacional (observador aéreo), passando então a trabalhar no socorro aeromédico.

AVHoje - nesses anos todos de operação algum atendimento o marcou com mais intensidade?
Francisco: foram muitos acontecimentos marcantes. Alguns com mais, outros com menos intensidade, mas nenhum deles passa pela vida de um bombeiro sem uma carga de emoção. Emoção essa que não pode interferir na ação de socorro imediato a quem necessita.
  Mas posso citar o de um atendimento em São José da Lapa, quando estávamos em treinamento de combate a incêndio, na Serra do Rola Moça, e tivemos uma notícia/rádio de um acidente com duas crianças na piscina de um sítio daquela localidade. Infelizmente uma delas evoluiu para óbito e a outra transportada para o Hospital João XXIII, depois de uma escala no Hospital Risoleta Neves, em razão de a vítima ter sofrido uma parada cardíaca.
   Em uma outra ocasião, servindo ainda no Batalhão de Contagem, ocorreu um desabamento no Parque São João. As guarnições saíram em socorro e eu fiquei no pátio. Pouco depois chegou um cidadão em uma kombi e dela desembarcou um pai com uma criança vítima do soterramento sem sinais vitais. Coloquei a criança no chão, fiz massagem cardíaca e respiração artificial, obtendo a graça de vê-la voltar a respirar. Uma ambulância a conduziu depois para o hospital.
   Mas, certamente, a ocorrência mais impactante tenha sido a tragédia da Vila Barraginha, em Contagem, quando um deslizamento de terra soterrou 150 barracos e vitimou 37 pessoas em 18 de março de 1992.
Eu fiz parte da primeira guarnição a chegar. A imagem mais forte, que ainda hoje me vem à mente, foi o encontro de uma criança já sem vida, segurando um lápis sobre o caderno.

AVHoje - qual missão foi mais desafiadora para você e para a aeronave?
Francisco: não diria que haja alguma missão mais desafiadora para o bombeiro. O bombeiro vive o desafio cotidiano de diminuir a distância entre a vítima e o socorro, proporcionando a possibilidade de a vítima continuar viva.
O tempo é o maior obstáculo a ser vencido. É preciso chegar rápido ao local e prestar os primeiros socorros, além de estabilizar o vitimado para ser conduzido ao Hospital mais próximo.
   Com relação à aeronave eu posso dizer que foi em janeiro de 2009, em apoio ao resgate das vítimas de uma inundação na avenida Tereza Cristina (Belo Horizonte), quando as condições de tempo eram muito adversas para o helicóptero. Ventava com muita intensidade dificultando sobremaneira a chegada da aeronave ao local, para socorrer duas vítimas em iminente risco de morte. Esta operação só foi concluída com sucesso em razão da rápida e acertada tomada de decisões da equipe empenhada.
  Entretanto, em situações de serra e montanha, ou em situações de muito calor, a aeronave enfrenta restrições de peso, exigindo mais esforço do equipamento e colocando à prova a capacidade e a experiência do piloto.

AVHoje - existiu alguma dificuldade de adaptação à aeronave?
Francisco: veja bem, o sentimento de prazer que se tem ao trabalhar na aviação, coloca as possíveis dificuldades como situações normais e inerentes à atividade. Também passamos por um curso que nos capacita para desenvolver o trabalho de modo a enxergar possíveis dificuldades como tarefas a serem realizadas. Por outra análise, o prazer e o amor que se dedica ao desempenho das funções, neutraliza qualquer dificuldade.

AVHoje - a vida do soldado interfere na vida do homem bombeiro?
Francisco: o homem bombeiro vive uma vida de soldado, mas também tem vida social, preocupa-se com a sua integridade e forma física e procura manter intacta sua integridade social e moral. Inegavelmente, fardado ou sem farda, sou um bombeiro, e, se chamado, estarei sempre pronto e disposto a socorrer quando necessário for. Isso faz parte do vocacional.

AVHoje - embora já se aposentando, as missões passeiam em seus sonhos?
Francisco: as missões se eternizam em nossa mente. Não diria que elas povoem os sonhos, mas voltam à mente sempre que passo por locais onde atuei. Em locais nos quais tivemos a sorte de ajudar a salvar alguém.
É inevitável relembrar cenas, atitudes e resultados nem sempre satisfatórios, pois a vida, às vezes, nos reserva situações sobre as quais não nos cabe o poder ou a prerrogativa da decisão.

AVHoje - o que diria para quem deseja ingressar nas fileiras?
Francisco: simples, é só ter amor ao próximo. Gostar de ajudar, amar ser útil, sentir-se bem e em paz ajudando o próximo. Sem amor procure outra carreira, porque a carreira de bombeiro envolve altruísmo e doação.


E então...
  O Aviação Hoje Notícias e o Plane Spotter BH, agradecem ao nosso entrevistado pela disponibilidade, ao Major Eduardo Cota Ramos pela amável recepção e aos demais bombeiros de plantão, que nos receberam com a cordialidade usual da Categoria.
  Na pessoa do bombeiro Francisco Geraldo de Oliveira, rendemos nossa admiração, respeito e reconhecimento a todos esses homens que dedicam sua vida à vida do próximo.
   Homens de coragem para ir aonde ninguém quer ir, por vezes até colocando em risco a própria vida, por pessoas que nem conhecem.
   Homens para os quais não há diferença entre a madrugada gelada ou um dia de sol escaldante; homens cuja coragem os impele a se moverem pela água ou pelo fogo, tendo em mente apenas o valor maior do ser humano, que é a dádiva da vida. A estes Homens a nossa GRATIDÃO e esta singela homenagem!